O BOI CAPRICHOSO
Somos o Boi Negro de Parintins!
Era 1913 quando a Parintins antiga viu nascer nos terreiros úmidos do “Reduto do Esconde”, pelas bandas do Urubuzal, o Boi Caprichoso. Nascido das mãos calejadas de Seu Roque Cid e seus irmãos, Antônio Cid, Beatriz Cid e Pedro Cid, naturais de Crato, no Ceará. O mais velho, Pedro Cid, resolve ficar em Belém, precisava de trabalho urgentemente. Os outros, Roque Cid e Antônio Cid, seguem para Manaus. Aportando em Parintins, saltam e resolvem ficar. O ano era 1913, os Cid ainda não haviam concretizado todos os seus sonhos de prosperar na nova terra e resolvem que vão retornar às suas origens. Fala-lhes sobre um boi de nome Caprichoso que assistira em Manaus, na Praça 14 de Janeiro, contou-lhes como foi sua evolução: toadas, desafios e animação. Os irmãos Cid enchem-se de coragem e no dia 20 de outubro de 1913, juntamente com outros amigos e a promessa a São João foi cumprida: nasce o boi Caprichoso no local conhecido como Esconde, hoje a Travessa Sá Peixoto.
Assim, desde então, de couro negro e luzidio, o boi Caprichoso saiu às ruas pela primeira vez, demarcando seu território azulado, brincado pelas ruas de Parintins, sob as luzes de lamparinas. O boi brincava, dançando estimulado pela cantoria do Amo e a euforia dos brincantes em número reduzido e lá se iam ao som da marujada, entoando seus desafios, incentivados pelos torcedores.
De vez em quando, uma parada para o ritual do tira a língua. O boi morria, atirado por pai Francisco para satisfazer o desejo de Mãe Catirina. Sua língua era retirada e vendida ao dono da casa. Assim, angariavam fundos para os festejos da morte do boi quando encerravam os folguedos juninos.
Nascido das mãos de gente simples, logo ganha a simpatia de muitos, tornando-se assim, o presente do povo: pescadores, lavadeiras, pedreiros, compadres e comadres. Eram os nossos primeiros brincantes.
De lá para cá, o Boi Caprichoso ganhou os quintais e as ruas, sempre brincando e alegrando a nossa gente pobre, negra, indígena e ribeirinha, refletida na estrela azul e branca da testa do Boi Negro da Ilha, lindo e popular. Sob lamparinas de Seu Lioca e cumprimento da promessa junina, fortalecia-se, aos poucos, uma festança popular que, ao longo das gerações, permitiu que os parintinenses sonhassem outros futuros, tecidos por meio dos saberes e da sensibilidade de nossa gente cabocla, energizada na utopia e na busca de uma imaginada revolução oriunda desde nossa ancestralidade. Nossos artistas populares, com suas esculturas superlativas, ganharam o Brasil e o mundo, tornando a nós, do Boi Caprichoso, os mais aguerridos lutadores da cultura parintinense.
Metamorfoseamos o ritmo tradicional e o ambiente do folguedo em espetáculo capaz de mobilizar multidões e de colocar em cena a louvação à Mãe Natureza, ao passo em que se denunciam as violações dos direitos dos povos da floresta. Valorizamos nossa história de tantas memórias e camadas, diversas em etnias, gêneros, religiões e orientações sexuais. Nossas ruas são galerias vivas de uma arte popular a nutrir e expandir a cultura nacional. Semeamos arte em reinvenções permanentes, refazendo identidades, emoldurando ancestralidades com as demandas atuais que brotam de nossa gente.
O Caprichoso é o bumbá que permanece se nutrindo em mais de cem anos, nos batuques libertários dos quilombos, em meio a marchas e acampamentos de povos originários, no suor de artesãos locais e nas expressividades dos que ousaram criar aqui, no meio da Amazônia, as estruturas gigantescas que nomeamos em nossos saberes-fazeres de ousadia.
Seguiremos sustentando, em mais de 50 edições do Festival Folclórico, com nossos artistas do Boi-Bumbá Caprichoso, que a função máxima de nossa festa é bradar a todos os cantos a luta dos homens e das mulheres da floresta, transformando nossos anseios e sonhos em luta: luta em poesia na chama viva da cultura popular do Boi Negro de Parintins!
Fonte – Estrelas de Um centenário – Odnéia Andrade.
Foto: Alex Pazuello | Boi Caprichoso 01/07/2023.
CULTURA – O TRIUNFO DO POVO
No princípio, as deusas e deuses criaram Parintins, território sagrado de encantarias e mistérios. Suas gentes, expressão divina da criação, passaram a ser dotadas de saberes e fazeres específicos, um talento cuja vocação se faz presente em cada gesto e em cada canto, em cada palavra e sorriso, um brado de luta e emancipação.
Essa gente que se fez água, que se fez cor, que é noite e dia, frio e calor, tornou-se a personificação da natureza sagrada, e como tal, a expressão da resistência contra tantos outros e outras que insistem na destruição dos biomas. Quando uma árvore é derrubada, quando o rio é poluído, o parintinense chora porque é feito da mesma matéria que a produziu, do mesmo ato de criação a que se fez parte. Do mesmo gesto e do mesmo verbo.
Parintins é Amazônia. Parintins é Brasil.
As gentes da Amazônia são unas porque são muitas. Simples e plural. Povo e multidão. Essa gente é sabor porque são muitos os gostos e aromas das comidas de indígenas e caboclos. É crença, crendices e adivinhação.
É mito que explica a origem dos seres e da natureza. É rito, que dramatiza histórias e marca as fases da vida. É lenda, dos caboclos e ribeirinhos, gente das águas e das matas.
É o quilombo do Erepecuru, “a força de um povo que vem do rio”, é Tambor de Mina, é Retumbão, a dança dos marujeiros de Bragança. É a corda do Círio, os brinquedos de Miriti, a força das mulheres coletoras da pimenta Baniwa, a pesca com Timbó, o gambá de Maués, o Puxirum dos caboclos.
É arte, que torna singular os ilhéus de Parintins, com suas cores e expressões, fantasias e alegorias, cantos e danças. É mestre Bacuri, da Marujada de Guerra, que faz do pulsar do seu tambor, o símbolo da resistência, onde os bumbás da Amazônia, um dia, foram perseguidos pelas elites.
É ancestralidade porque sabemos de onde viemos. É presente porque o vivemos. É futuro porque sabemos onde queremos chegar. É fé, a expressão de um povo de luz e de esperança, que na dúvida das suas incertezas, creditam aos deuses seus nortes e consciências.
Essa gente é Caprichoso, o boi preto de Parintins, o verdadeiro boi do povo, construído por muitas mãos, expressão do coletivo, de Roque e Ednelza Cid, Luiz Gonzaga e Luiz Pereira, Dora e Chica, Joãos e Marias. É festa, cor, liberdade e poesia. É a criança com seu brincar, é a Marujada no dois pra lá e dois pra cá. É Arlindo Júnior e Daniel, cantador de boi.
É Lióca e o iluminar de sua lamparina que, mais uma vez, conduz os caminhos do touro amado e de sua galera, anunciando e exaltando a chegada do boi campeão.
Tudo isso é Parintins. Tudo isso é Amazônia. Tudo isso é Caprichoso.
Tudo isso é “Cultura – O Triunfo do Povo”.
Notícias
- Caprichoso inova e anuncia Escola de Arte com nova proposta pedagógica
- Cunhã-poranga do Caprichoso, Marciele Albuquerque, eleva voz indígena da Amazônia na COP 29, no Azerbaijão
- Cunhã-poranga do Caprichoso, Marciele Albuquerque, eleva voz indígena da Amazônia na COP 29, no Azerbaijão
- Em defesa dos povos e das florestas, Caprichoso mobiliza nação azulada para Movimento Amazônia de Pé
- Boi Caprichoso: “Sócio Pavulagem” vai ajudar na construção de Novo Galpão de alegorias, anuncia Rossy Amoedo
Escritório Central
Rua Silva Meireles, 1645 – Centro
69151280 – Parintins, AM
Fone: 559235334676 – Fax: 559235333192
contato@boicaprichoso.com