O BOI CAPRICHOSO

Era 1913 quando a Parintins antiga viu nascer nos terreiros úmidos do reduto do esconde, o Caprichoso. Nascido das mãos calejadas de seu Roque Cid, esse presente logo foi abraçado por pescadores, lavradores e mateiros, compadres e comadres. Eram os nossos primeiros brincantes. Muitos deles, nordestino, vindos para Amazônia em busca de um futuro melhor.
De lá pra cá, o Boi ganhou os quintais e as ruas, sempre brincando e alegrando o povo humilde. Sob lamparinas do Seu Lioca, fortalecia-se, aos poucos, essa festança popular que, ao longo das gerações, permitiu que os parintineses sonhassem com outro futuro, tecido a partir dos saberes e da sensibilidade dessa gente cabocla, energizada na utopia e em busca de uma revolução ancestral. Foi assim que os nossos artistas populares que conquistaram o Brasil e o mundo e que nós, do Boi Caprichoso, nos tornamos os mais aguerridos lutadores da cultura parintinense.
Transformamos o ritmo tradicional e o ambiente do folguedo em espetáculo capaz de mobilizar multidões e de colocar em cena tanto a louvação à mãe natureza quanto a denúncia das violações dos direitos dos povos da floresta. Cultivamos aqui, ao longo de nossa história feita a muitas mãos, a diversidade étnica, de gênero, de religiões… em busca de direitos iguais para todos.
Isso nos fez conceber as ruas como galerias vivas, cheias de uma arte popular que ao mesmo tempo nutre a se mistura com a cultura brasileira. Arte em processo de reinvenção permanente, refazendo as identidades, misturando nossa ancestralidade às novas demandas sociais que vêm do povo. Nosso Boi de Negro, fez-se assim, no meio de gentes diversas, dos que aqui estavam e dos muitos que aqui chegaram nesses mais de 100 anos. E foi se reinventando, nos batuques libertários dos quilombos, em meio aos povos indígenas em acampamentos e marchas, no suor dos artesãos locais e na expressividades dos que ousaram criar aqui, no meio da Amazônia, as estruturas gigantescas que se tornaram sinônimo da nossa ousadia.